Inglório
Com as costas ensanguentadas, chegou a cogitar abdicar de sua força de vontade e entregar-se ao infortúnio doloroso. Mas, um lapso vivaz o atingiu como uma flecha que atinge sua vítima: subitamente. Recobrou suas forças e tentou mais uma vez se livrar das correntes que pendiam do teto e o imobilizavam injustamente. A força empregada naquele movimento fugaz estava longe de conter qualquer centelha de eficácia, no entanto fora o suficiente para desconcentrar seu vigia e carrasco, até então entretido com as ranhuras do chão do calabouço pútrido em que se encontravam.
O homem de porte esquálido se irritava em demasia quando tirado de seus devaneios introspectivos. Como retaliação ao ato irrelevante de seu prisioneiro, buscou em uma travessa metálica um par de alfinetes, na qual esquentou com seu isqueiro de péssima qualidade. Após alguns instantes, incandesciam insanamente, para então adentrarem horizontalmente as pálpebras do encarcerado, que sentia tanto a sua pele quando o globo ocular queimar de maneira incontrolável.
Após acordar de seu desmaio, o prisioneiro nada via além de um borrão indistinguível. No entanto, em suas lembranças visualizava o franzino porém sádico homem, e estremecia ao sentir sua respiração ao fundo. O lapso de outrora esmorecia, e sentia-se novamente tentado a fenecer covardemente. Ao ser arrastado para o lado de uma pilastra que ali se encontrava, acabou por deslocar seu ombro, e urrou sem ser ouvido por ninguém exceto seu carrasco. Faminto, fraco e sujo, percebeu que seu fim se aproximava, assim como o pérfido carcereiro. Para seu horror, sua visão havia voltado, uma vez que vislumbrou um corpo desnudo, com a genitália ereta a dois palmos de seu rosto. Um cheiro desgostoso o assombrou, e então percebeu que eram provenientes das inúmeras feridas e chagas que denegriam a salubridade do sexo do homem nu. Ansiou vomitar, mas receou ser reprimido com inimagináveis atrocidades.
Imobilizado, nada pôde fazer para evitar que o monstro ereto fosse arrastado em seu semblante. Enojado, estava impotente e amargurado, desejando a morte ao invés do pus que o infestava e contaminava. Ouvia gemidos de um deleite doentio, exaurido de qualquer erotismo. Os segundos demoravam a passar. Quando já havia parado de tentar se desvincilhar daquele estupro putrefato, sentiu seus mamilos serem arrancados com um objeto metálico que depois descobriu ser uma alicate. A dor e o sofrimento eram o afrodisíaco do esquelético psicopata. Com seu peito agora também ensanguentado, constatava que a sua apatia quanto ao coito fora o motivo de suas novas injúrias. Se continuasse se debatendo, conservaria parte de sua integridade. Agora estava mutilado, enfrentando uma dor que nunca superaria. Degradado, vomitava em seu próprio corpo, debatendo-se no chão empapado, até sentir uma lâmina entrar e rasgar sua barriga de baixo pra cima.
Foi sodomizado enquanto jorrava quantidades inacreditáveis de sangue. Nas semanas que se passaram, tal episódio foi meticulosamente reconstruído pelo assassino diariamente, em um caso absurdo de necrofilia.
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